Alimentação e atividade física podem fazer muita diferença
São completamente desaconselhados o excesso de vitaminas, o emprego de hormônios masculinos e o uso de GH, nesta etapa da vida
A obesidade continua sendo o maior problema nutricional das sociedades desenvolvidas, mas, após a sexta década de vida, o peso geralmente se estabiliza e o que vemos é uma tendência inversa. “As pessoas começam a perder peso e uma estrutura vital que embeleza, sustenta e ajuda no equilíbrio do corpo humano: massa muscular. Com isso, além da perda de peso ocorre também a redução progressiva da força muscular”, afirma a endocrinologista Ellen Simone Paiva, diretora do Citen, Centro Integrado de Terapia Nutricional.
A massa magra é um dos componentes mais nobres do nosso corpo. É composta pelo tecido ósseo, água corporal e proteína muscular. Representa o nosso peso corporal, subtraindo-lhe a gordura. Todos esses elementos vão sendo reduzidos com o avançar da idade e sofrem uma queda percentual muito maior, quando uma pessoa acima de 60 anos perde peso. “Além da perda de peso, outros fatores favorecem a perda progressiva de massa magra, como a redução de vários estímulos hormonais e a inatividade física. Com o envelhecimento, a massa muscular passa por profundas modificações, como atrofia e perda das fibras musculares, o que resulta em redução do volume da massa muscular. Há também infiltração de gordura entre as fibras musculares, tornando os músculos mais flácidos, menos definidos e com menor força contrátil. Assim, diferente do que apregoamos para os adultos jovens, em relação aos benefícios da perda de peso, na terceira idade, devemos redobrar os cuidados com a dieta, pois o emagrecimento nem sempre é bem vindo”, reforça a endocrinologista.
A perda de massa muscular pode afetar todos os grupos musculares do corpo, reduzindo a força contrátil desempenhada por eles, o que provoca perda da definição muscular - que dá a beleza ao músculo jovem - maior desabilidade, insegurança ao caminhar, quedas, dificuldades para expandir a caixa torácica e para respirar amplamente ou tossir, com uma maior propensão a infecções de vias aéreas. “Uma vez que a perda de peso e a inatividade física são fatores dos mais importantes na determinação da perda de massa magra, torna-se fundamental uma alimentação adequada, que viabilize o aporte protéico necessário e a implementação de atividades físicas regulares para conseguirmos preservar a musculatura na terceira idade”, afirma Ellen Paiva.
Os benefícios da atividade física
A inatividade física, que ocorre progressivamente com o avançar da idade, é certamente um fator importante para a involução muscular que ocorre com o envelhecimento. “Esse efeito pode ser ainda mais intenso nas pessoas que se mantiveram sedentárias na juventude e apenas prolongaram esse comportamento ao longo da vida. Por outro lado, a prática regular de atividade física, desde jovem, lentifica a perda muscular do idoso. A prevenção é a estratégia mais importante e eficiente para evitar a perda de massa muscular na terceira idade”, alerta Ellen Paiva.
Para atingir o objetivo de preservar a massa muscular após os 60 anos, é recomendada a prática regular de atividade física, com uma freqüência mínima de 3 a 4 vezes por semana. Os melhores resultados são observados com a prática de exercícios de resistência. “Além da musculação, as modalidades mais benéficas são as caminhadas, a natação, a hidroginástica, as atividades de dança e os jogos coletivos. Todas estas atividades colaboram com uma menor perda de massa magra, um maior grau de socialização, um melhor desempenho cardiovascular e uma redução dos quadros de depressão, tão comuns na terceira idade”, observa a médica.
A dieta ideal na terceira idade
Vários estudos têm demonstrado a importância de uma boa alimentação, em todas as fases da vida. “E, por incrível que possa parecer, na terceira idade, encontramos uma maior dificuldade para implementar um plano dietético apropriado, pois os idosos apresentam vícios nutricionais importantes e, na maioria das vezes, têm muita dificuldade e resistência para mudá-los. Quando recebem as orientações nutricionais, ‘parecem concordar com elas’, mas engana-se o profissional de Nutrição que acredita piamente que eles as seguirão. Eles apresentam uma enorme dificuldade para realizar tamanhas mudanças, numa fase tão avançada da vida”, diz Ellen Paiva, que também é médica nutróloga.
A maioria das pessoas após os 60 anos não se alimenta adequadamente. “Geralmente, nos deparamos com idosos que comem mal, adoram guloseimas, evitam verduras e legumes e passam a beliscar mais e comer menos nas refeições básicas. Por conta própria, eles reduzem a ingestão calórica e protéica necessárias para atender às suas necessidades nutricionais. Uma das explicações para esse fato é a progressiva perda de apetite e de papilas gustativas, que faz com que muitos alimentos naturais sejam percebidos como ‘sem graça’ e ‘sem sabor’, e aqueles mais condimentados, mais salgados ou mais doces, picantes e fritos, se transformem em objeto de desejo”, diz Ellen Paiva.
Para sermos bem sucedidos na empreitada de alimentar bem o idoso, precisamos reforçar a necessidade de que eles façam as refeições básicas e evitem o padrão alimentar beliscador. “Dessa forma, conseguimos preservar a sensação de fome, que se perde com o avançar da idade”, explica a médica.
O idoso, geralmente, tem a necessidade de um maior aporte de micronutrientes e de algumas vitaminas, como é o caso do cálcio e da vitamina D, que afetam a densidade mineral óssea e expõem o idoso ao risco de sofrer com osteoporose e fraturas. “Para muitos, é necessária uma suplementação destes micronutrientes”, diz Ellen Paiva.
Uma característica importante da alimentação das pessoas nessa faixa etária é a progressiva redução na ingestão de proteínas, principalmente carnes. “Nesse contexto, nossa estratégia é voltada à adequação desse nutriente nas dietas, pois ele é fundamental à síntese da proteína muscular. Orientamos a utilização de preparações protéicas palatáveis e de fácil mastigação, como suflês e gratinados, que utilizam molhos à base de leite e queijos; carnes moídas ou desfiadas, como almôndegas cozidas e panquecas recheadas com tais preparações”, ensina a nutróloga.
“Aparentemente, não há benefícios em aumentar a ingestão de proteínas através de suplementos protéicos. Além de ineficazes, os suplementos protéicos podem levar à formação de cálculos renais. Na verdade, a melhor estratégia é adequar a alimentação do idoso às recomendações nutricionais adequadas à sua idade e, ao mesmo tempo, estimular a prática de uma atividade física”, diz Ellen Paiva.
Os aparentes benefícios dos suplementos e hormônios
A melhor fonte de vitaminas e sais minerais continua sendo o alimento. “Os suplementos vitamínicos em cápsulas, principalmente em altas doses, mostraram-se totalmente ineficientes em relação à prevenção de doenças crônicas, câncer e envelhecimento. Hoje, sabemos que essa prática, além de não ajudar as pessoas, pode trazer conseqüências deletérias à saúde”, diz a diretora do Citen.
O Conselho Federal de Medicina reiterou, recentemente, por meio da Resolução CFM Nº 1.938/2010, a proibição a vários procedimentos da prática ortomolecular. Dentre as práticas condenadas pelo órgão fiscalizador está a correção de possíveis desequilíbrios nutricionais por meio do uso de suplementos de vitaminas, minerais, aminoácidos e ácidos graxos. Segundo a norma, hoje, já existem evidências científicas suficientes que revelam que a suplementação vitamínica sem necessidade pode aumentar os riscos de morte.
Os efeitos dos hormônios masculinos para aumentar a massa muscular sempre nos seduziram e nos encheram de esperanças quanto à possibilidade deles serem usados na terceira idade. “Mas, sempre que essa possibilidade é lembrada, ela se refere apenas à reposição dos hormônios masculinos em homens com deficiência de produção desses hormônios. Mesmo nesses casos, há ainda muitas dúvidas e opiniões contraditórias”, alerta Ellen Paiva. As reações adversas mais comuns devido ao uso dos hormônios masculinos são a retenção de água, o aparecimento de mamas no homem, o aumento do PSA (antígeno prostático específico) - um marcador de câncer de próstata - o aumento do volume prostático, alterações no fígado e uma elevação das taxas de colesterol e triglicérides.
A possibilidade da utilização destes hormônios, indiscriminadamente, em homens e mulheres normais na terceira idade, com o objetivo de preservar ou até ganhar massa muscular é ainda mais polêmica. “As evidências científicas não sustentam essa prática devido aos vários efeitos colaterais. Na mulher, há ainda a possibilidade de virilização, com atrofia mamária, aumento dos pelos e surgimento de acne”, alerta a endocrinologista Ellen Paiva.
Outra medicação ‘potencialmente benéfica para a terceira idade’, o GH ou hormônio de crescimento, também deve ter sua utilização direcionada apenas para as pessoas com deficiência deste hormônio. Muito usado nas academias de ginásticas, apesar dos alertas freqüentes da Sociedade Brasileira de Endocrinologia, esse hormônio era tido como um ‘verdadeiro milagre para emagrecer e rejuvenescer’, com capacidade de reduzir a massa gorda, aumentar a massa muscular e melhorar a disposição.
“Uma recente edição de uma das maiores revistas de Clinica Médica do mundo, a Annals of Internal Medicine, traz um estudo que reuniu 31 dos maiores trabalhos científicos sobre GH. Os autores concluem que o hormônio não influencia no processo de envelhecimento, portanto, o seu uso com este fim não tem base científica alguma. O seu uso por pessoas sadias pode provocar efeitos colaterais muito desagradáveis, tais como dores articulares e inchaços, além de propiciar o desenvolvimento de doenças como diabetes, lesões cardíacas e câncer de próstata. A melhora da composição corporal atribuída ao GH - que seria o aumento da massa muscular - demonstrou-se muito pequena, não justificando os riscos do seu uso na terceira idade”, alerta a endocrinologista Ellen Simone Paiva.
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